Ana Raia

Era meados dos anos 90 e ela, Ana Raia, estava em um retiro com um cara chamado Deepak Chopra na Califórnia. Retiro não era moda na época, era algo muito novo, quase desconhecido logo, era estranhíssimo. E Ana estava lá, feliz. Quando autoconhecimento era assunto alternativo, ela já o estudava com afinco. Ana Raia é pioneira nos estudos do comportamento e do desenvolvimento humano e fez escola em diferentes fontes. Cruzou conhecimentos e sabedorias, somou com vivências práticas, e criou sua linguagem que é didática e acolhedora. São mais de 20 anos de estudos e profissão. São milhares de atendimentos, palestras e uma única certeza: tudo muda o tempo todo. “A vida é impermanente, é movimento. E isso é o mais bonito e assustador da vida”, diz ela, em um papo exclusivo com o IT brands, sobre a importância de saber explicar como “você se sente”. 


Por que as pessoas têm tanta dificuldade em descrever como elas de fato se sentem?


Sou contra generalizações, cada caso é um caso e a resposta certa é a resposta verdadeira. Mas no coletivo, acontece que vivemos em um mundo acelerado em que nos acostumamos à viver no modo sobrevivência, com pressa, e “na performance" a todo custo, porque a performance é o valor da vez. E dentro disso, sentir é um ato de coragem. Veja…sentir custa tempo e pode ainda nos levar para um lugar que estamos desacostumados: o do incômodo. Com pressa, ­­querendo fazer tudo ao mesmo tempo  e sabendo que sentir é um processo e que ainda pode ser desconfortável, a escolha que prevalece é a do não sentir e a de sempre dizer que "está tudo bem”, mesmo quando está tudo horrível. O nosso mundo emocional é do tamanho que conseguimos sentí-lo e descrevê-lo. Enquanto não resgatarmos o tempo, o repertório, o desconforto, o valor do sentir…não saberemos dizer verdadeiramente como nos sentimos.   E sem sentir é impossível se entender e se expressar.  E tem a onda da positividade tóxica, que condena, julga tudo que não é positivo e induz as pessoas a oprimirem e rejeitarem os sentimentos negativos. Somando tudo isso é mesmo complicado de sentir à vontade para  expressar sua verdade para o mundo. 


Qual a solução?


Não existe uma mágica e , como disse, cada caso é um caso. Mas uma sugestão é começar com a aceitação da realidade: a  vida inclui alegria e também sofrimento. Aceitar a realidade, a vulnerabilidade e se arriscar a sentir a dor, a raiva e sentimentos assim. Veja, é importante reconhecer as emoções negativas e sentí-las para que você possa as entender e se libertar delas. As emoções não definem você, vem e vão, e nessa passagem funcionam como um farol que aponta informações importantes sobre você e seus valores. Quem se permite sentir e identificar essa mensagem, irá agir  cada vez mais alinhada com seus valores. E isso é evoluir. 


Aceitação radical da realidade, aceitação das emoções negativas, aceitação da impermanência da vida. Tudo está relacionado a algum tipo de aceitação ?


Sim. Mas é importante dizer que não falo da aceitação como resignação, mas como uma maneira de entender a realidade para poder transformá-la.  É impossível mudar algo sem aceitação, na resistência, porque é preciso conhecer para transformar, procurar soluções. Mas é importante dizer que cada pessoa tem o seu próprio tempo, a sua própria resposta, o seu próprio meio para percorrer essa jornada de aceitação. Acreditar em uma resposta unânime é roubada. "Ensina-me a viver" é um ótimo nome de romance, de filme. Na vida real, o ensinamento é na pele, é individual , impermanente, e por isso tão lindo.